Para governo Bolsonaro, dificultar aposentadoria de pobre é combater privilégios
12 março, terça-feira, 2019 às 11:37 am
A proposta de reforma da Previdência de Jair Bolsonaro (PSL) não combate as desigualdades nem acaba com privilégios. O principal alvo da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 006/2019), a chamada PEC da reforma, são os trabalhadores e trabalhadoras da iniciativa privada que ganham menos, passam longos períodos desempregados ou com empregos precários, sem carteira assinada e, portanto, sem condições de contribuir com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Mais de 92% dos benefícios previdenciários pagos pelo governo são de até três salários mínimos (R$ 2.294,00) e 80% dos trabalhadores que se aposentam por idade ganham apenas um salário mínimo (R$ 998,00). A reforma de Bolsonaro quer obrigar esses trabalhadores a contribuírem mais cinco anos para receberem menos de aposentadoria.
Atualmente, os trabalhadores e trabalhadoras do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) podem optar por uma das duas formas de aposentadoria: por idade e por tempo de contribuição. A aposentadoria por idade exige 15 anos de contribuição e idade mínima de 60 anos (mulheres) e 65 anos (homens). O valor médio dos benefícios é de R$ 1.051,93.
Já a aposentadoria por tempo de contribuição não tem exigência de idade mínima. As mulheres precisam contribuir por 30 anos e os homens, 35 anos. É possível se aposentar também pela fórmula 86/96. O valor médio das aposentadorias nesse modelo, que alcança a população de renda um pouco mais alta e que consegue se manter em um emprego formal por mais tempo, é de R$ 2.264,74.
Para Bolsonaro, esses trabalhadores, que não chegam a receber o salário mínimo ideal calculado pelo Dieese para sustentar uma família de quatro pessoas (R$ 3.960,57), são considerados privilegiados. Por isso, ele quer acabar com a modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição, aumentar o tempo mínimo de contribuição de 15 para 20 anos e estabelecer a idade mínima de 65 anos para os homens e 62 para as mulheres.
Se a proposta do governo for aprovada, o trabalhador que conseguir se aposentar pelas novas regras, só receberá 60% do valor do benefício. Para receber o valor integral, terá de contribuir por pelo menos 40 anos. Ou seja, será preciso contribuir por mais tempo para receber menos de aposentadoria.
Para o ex-ministro da Previdência Social do governo Lula, Ricardo Berzoini, se o Congresso aprovar a PEC da Reforma, a queda da cobertura previdenciária e o rebaixamento do valor dos benefícios podem causar sérios prejuízos para a economia, sobretudo dos municípios que dependem das aposentadorias para girar o comércio e a economia local. "A crise econômica poderá se agravar mais e o peso de tudo recairá nas costas da classe trabalhadora brasileira", alerta o ex-ministro Ricardo Berzoini.
Confira a tabela do Dieese!
Proposta não combate privilégios O presidente nacional da CUT, Vagner Freitas, critica o argumento do governo de que a imposição de idade mínima vai acabar com privilégios. Para ele, isso é um engodo para esconder o fato de que Bolsonaro não mexerá nos setores da sociedade que são verdadeiramente privilegiados. "Não se combate privilégios impondo regras iguais para quem vive a desigualdade no mercado de trabalho, como as mulheres, os rurais, professores, e trabalhadores informais, que vivem em condições precárias. Isso é impor a injustiça e desigualdade como regra de acesso à aposentadoria", salienta Vagner Freitas. A proposta, segundo Vagner, não faz nenhuma revisão dos privilégios de militares e de setores econômicos beneficiados por desonerações. “Os ricos continuarão pagando pouco imposto e a reforma da Previdência afetará os trabalhadores, sobretudo os mais pobres, que terão a exigência de mais tempo de contribuição, com a redução nos valores dos benefícios”. Estudo da assessoria parlamentar do PT no Congresso Nacional aponta que o déficit com os militares, que não foram incluídos na proposta, foi de R$ 43,9 bilhões em 2018, considerando reservas, reformas e pensões. Segundo o estudo, as desonerações, também citadas pelo presidente da CUT, alcançam 4% do PIB em 2019. Vagner cita, ainda, que a proposta de Bolsonaro não prevê o combate aos sonegadores da Previdência. “São praticamente R$ 500 bilhões de perdas aos cofres públicos somente com sonegação de empresários”. Trabalhadores jogados à miséria Na avaliação de Berzoini, a proposta de reforma da Previdência de Bolsonaro exclui muita gente do sistema e coloca milhares de trabalhadores na pobreza. “Não é uma questão de se aposentar mal, é uma questão de não conseguir se aposentar mesmo. A proposta pode excluir mais de 30% dos trabalhadores do sistema previdenciário que hoje têm dificuldade de comprovar 15 anos”. Para o ex-ministro, milhares de pessoas seriam jogadas à condição de pobreza extrema e “muitos vão cair no BPC (Benefício de Prestação Continuada), que é um benefício assistencial para quem não tem condições dignas de sobrevivência”. Pela proposta de Bolsonaro, os beneficiários do BPC também terão perdas. O valor do benefício cairia de um salário mínimo para R$ 400,00 e seria pago aos idosos em condição de miséria a partir dos 60 anos. Para receber o valor integral, o idoso terá de ter 70 anos, cinco anos a mais do que é exigido hoje (65 anos). “Essa visão preconceituosa de quem vem do mercado financeiro, como é o caso do Guedes, de que pobre gera despesa para o Estado pode causar sérios impactos para a economia do país”, diz Berzoini se referindo ao banqueiro e ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes. Reforma tributária O ex-ministro da Previdência do governo Lula acredita que essa proposta de Bolsonaro representa, na verdade, uma reforma fiscal e não combate privilégios ou possíveis distorções existentes hoje no atual sistema. O caminho, segundo Berzoini, é fazer uma reforma tributária, onde quem ganha mais paga mais e quem ganha menos paga menos, para depois pensar em qualquer alternativa de mexer na Previdência. “Querem usar a reforma da Previdência para fazer uma reforma fiscal que prejudica o povo. Precisamos corrigir distorções do sistema tributário sim, mas desde que comece por taxar grandes fortunas, lucros e dividendos, ou seja, os mais ricos”.
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